Comunicação sustentável: é sobre causa, verdade e consistência
15 de setembro de 2021
*Um conteúdo Bússola produzido por nosso diretor de ESG, Danilo Maeda
Uma das críticas mais frequentes em relação às estratégias de sustentabilidade é que parte delas é feita apenas com fins de comunicação e marketing. O chamado greenwashing é composto por ações com pouco efeito prático, mas que geram visibilidade positiva para marcas que não se engajaram verdadeiramente com objetivos de transformação e geração de impactos positivos.
Isso não significa, contudo, que ao adotar uma estratégia de sustentabilidade consistente sua empresa deva ficar em silêncio. Até porque a percepção das audiências sobre sua marca tem impactos diretos no negócio, como demonstra uma pesquisa realizada pela RepTrak. Segundo o estudo, 78% das pessoas afirmam ter disposição para comprar de marcas com ótima reputação, contra 9% quando a reputação é ruim. Em disposição para trabalhar, os índices são de 70% contra 11%. E em possibilidade de dar o benefício da dúvida, a diferença é de 64% contra 7%. Ou seja: reputação é sinônimo de vantagem competitiva.
A pesquisa também indica uma forte correlação entre reputação e a percepção de que a marca possui um propósito claro. Outros pontos importantes são: identificar os melhores canais para atingir os públicos prioritários, conhecer o que é importante para eles e reconhecer seus impactos (como temos discutido neste espaço), entender o comportamento de diferentes segmentos (e as suas diversidades) e desenvolver lideranças fortes que representam na prática os valores da empresa. Por fim, o estudo demonstra que a comunicação dos aspectos ambientais, sociais e de governança possuem impacto maior do que os próprios produtos ou serviços na construção da reputação de marca.
Vivemos um tempo marcado pela hiperconectividade, ativismo e demanda crescente por transparência. É o que tenho chamado de Era da Verdade, um tempo em que consistência e engajamento genuíno são as chaves para construir reputação. Não há mais espaço para projetar imagens que não correspondem à realidade. A sabedoria popular já decretava que mentira tem perna curta. Greenwashing também.
Diante desses dados e tendências, algumas marcas têm adotado uma postura mais ativa em causas sociais relevantes para seus consumidores – as chamadas marcas engajadas (ou legislative brands). Um exemplo notório com resultados positivos para o negócio é o envolvimento da Nike nas causas feminista e antirracista. Em 2018, quando o slogan Just do it completou 30 anos, a marca contratou como garoto propaganda o ex-jogador da NFL Colin Kaepernick, que protagonizou protestos ajoelhando-se durante a execução do hino nacional para chamar atenção ao número de negros mortos pela polícia no seu país.
Como reação imediata, foi realizada uma tentativa de boicote por parte dos consumidores mais reacionários, que discordaram do protesto realizado pelo atleta. As ações da Nike na bolsa caíram 3,2% no primeiro dia após o lançamento da campanha. Sinal de que a decisão foi errada? Na verdade, não. Pouco tempo depois, houve reversão da tendência. Dados da Thomson Reuters Proprietary Research mostravam que as vendas cresceram 61% nos primeiros dez dias e as ações da empresa na bolsa já eram negociadas em valor superior ao de antes da campanha.
Desde então, a Nike reforçou seu posicionamento em novas campanhas e seu valor de mercado apresenta trajetória de crescimento. Mais recentemente, no Brasil, a Natura experimentou movimento semelhante ao endossar a causa da inclusão de pessoas transsexuais, com o ator trans Thammy Miranda como um dos participantes de sua propaganda de Dia dos Pais. Apesar de uma tentativa de boicote, as ações da empresa fecharam em alta de 6,7% dois dias após o lançamento da campanha.
Seja pela reputação, valor de marca, engajamento com audiências e até impacto comercial, vale a pena engajar sua empresa em causas e se comunicar sobre isso, desde que seja feito com consistência e que o compromisso seja uma verdade dentro da organização.
O grau de envolvimento de cada marca com causas sociais irá depender de fatores como engajamento dos gestores e relevância do tema para os stakeholders. Em termos simples, uma estratégia de comunicação sustentável deveria passar ao menos pelos seguintes passos:
1) Mapeie os assuntos relevantes para o seu negócio e para seus públicos mais estratégicos – concentrar-se nos temas materiais deve ser o primeiro filtro de uma comunicação sustentável, consiste e livre de greenwashing;
2) Desenvolva um plano de ação consistente, com metas claras e engaje a empresa nestes objetivos – fazer a lição de casa é fundamental. Ou para usar os termos da moda: storydoing antes de storytelling;
3) Comunique com suas audiências sobre o que tem sido feito e aproveite para ouvir feedbacks (afinal, engajamento é uma via de mão dupla). Aqui, é fundamental uma estratégia consistente para pensar nas mensagens, narrativas e canais a serem utilizados. Comunicação não é só sobre o que queremos dizer, mas principalmente sobre o quê (e como) nossos públicos entendem e querem ouvir;
4) Reveja periodicamente sua estratégia socioambiental para garantir que ela continue alinhada com a realidade. As coisas mudam, e em ritmo cada vez mais rápido. Use a inteligência de dados associada à inteligência humana para interpretar a realidade e entender se aquela meta assumida há alguns anos continua alinhada com as expectativas dos seus stakeholders ou agora a exigência aumentou.
5) Lembre que sustentabilidade é um caminho que se trilha em conjunto. Estamos em uma jornada de longo prazo. Além do senso de direção, é preciso lidar com ajustes de rotas e construir parcerias duradouras para ampliar os impactos positivos e resolver problemas sistêmicos. Como diz a música, é impossível ser feliz sozinho.